202109.12
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Justiça mineira afasta pagamento de R$ 80 milhões por seguradoras ao Banco do Brasil

Indenização por quebra de contrato era cobrada de um pool de seguradoras, entre elas a Zurich Seguros

O Banco do Brasil saiu derrotado em uma disputa de mais de duas décadas travada contra a Zurich Seguros e um pool de seguradoras. A Justiça de Minas Gerais negou à instituição financeira uma indenização de aproximadamente R$ 80 milhões por suposto descumprimento de contrato de garantia. Ainda cabe recurso.

A discussão envolve a Cia. Itaunense. Ela celebrou em maio de 1994 um contrato de compra e venda para entregar 18 mil toneladas de vergalhões de aço a uma trading alemã, com pagamento antecipado de US$ 3,6 milhões. Para fechar o negócio, porém, a trading exigiu um seguro garantia, fechado à época com Minas-Brasil Cia. de Seguros (atual Zurich Seguros) e um pool de seguradoras.

Dois meses depois do negócio fechado, a Itaunense e o Banco do Brasil assinaram um instrumento denominado “Contrato de Outorga de Garantia Bancária Mediante a Prestação de Contragarantia Recíproca”. Com isso, a agência do banco em Hamburgo, na Alemanha, emitiu em favor da trading alemã uma garantia bancária de reembolso no valor de US$ 3,6 milhões. Em contragarantia, a trading cedeu ao BB os direitos do seguro garantia.

“Como a Cia. Itaunense não cumpriu com suas obrigações contratuais de fornecedora exportadora, entendeu como configurado o sinistro e passou [o banco] a fazer a cobrança das seguradoras, primeiramente por notificação e, em seguida, valendo-se da via judicial”, explica o advogado Ernesto Tzirulnik, que representa a Zurich Seguros no processo.

As seguradoras alegam que a alteração contratual (outorga), que coloca o banco como credor do seguro, foi feita de forma unilateral. Argumentam ainda que o aditivo modificou substancialmente o risco garantido pelo contrato de seguro.

Além disso, afirmam que a Itaunense estava em fase pré-falimentar por incapacidade financeira e que, nessa situação, contratou promessa de exportação de produtos vendidos muito abaixo do preço praticado no mercado internacional.

A discussão já foi levada ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), por meio de recurso, e voltou para a vara de origem. Recentemente, o juiz Pedro Cândido Fiuza Neto, da 6ª Vara Cível de Belo Horizonte, acolheu a tese das seguradoras e afastou a indenização ao banco.

“Além de não aplicar o capital na produção do aço vendido, objeto do seguro, a Cia Itaunense já se encontrava praticamente em estado de insolvência quando contratou o seguro. E mais do que isso, celebrou o contrato de venda do aço por valor bem abaixo do valor de custo de produção”, diz o magistrado.

Ele acrescenta que “tal fato, aliado à situação de insolvência prática da Cia Itaunense, revela sua nítida intenção de não entregar a mercadoria vendida desde o momento em que celebrou o contrato de exportação”.

Para Fiuza Neto, isso fica ainda mais evidente quando se verifica que o valor recebido foi usado para o pagamento de saldos devedores em instituições bancárias diversas em apenas dois dias. “Para que não fique dúvida de que a tomadora não agiu de boa-fé ao celebrar o contrato de seguro com as rés, vale ressaltar que a perícia constatou que ela sequer tinha condições de cumprir o contrato de exportação garantido pelas rés” (processo nº 1106687-80.1997.8.13.0024).

Por meio da assessoria de imprensa, o Banco do Brasil disse que avalia o teor da sentença para a interposição dos recursos judiciais cabíveis. Não foram encontrados representantes da Cia. Itaunense para comentar o assunto.

Contexto

Nos anos 90, segundo o advogado Ernesto Tzirulnik, o mercado segurador começou a ser procurado por empresas em situação financeira difícil para garantir contrato de compra e venda futura com adiantamento de pagamento pelo comprador. À época, lembra, algumas preferiam desistir da ação de cobrança. “Algumas empresas optaram por desistir, quando era pedida a prova pericial”, afirma.

O imbróglio envolvendo o setor teria levado o IRB Brasil, principal resseguradora do país, a não operar mais com resseguro nesse segmento. Segundo especialistas, o IRB parou de operar devido à modelagem, precificação e condições de mercado.

Por: Gilmara Santos

Fonte: Valor Econômico
https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2021/09/04/justica-mineira-afasta-pagamento-de-r-80-milhoes-por-seguradoras-ao-banco-do-brasil.ghtml